quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

A Reforma Protestante e as suas principais causas (Parte II)


- Como dito anteriormente (parte 1 do estudo), o palco para a Reforma Protestante do século XVI já estava montado. Na Europa, era notório o espírito de independência e de reforma que se despertava, porém a chama desse movimento começou a arder de fato na Alemanha, sob a liderança do monge agostiniano Martinho Lutero, professor da Universidade de Wittenberg.
- Preliminarmente, quero transcrever importante trecho do livro “História da igreja cristã(1)” que de forma objetiva resume o clima em que vivia a Alemanha no início do século XVI: “O papa reinante, Leão X, em razão da necessidade de avultadas somas para terminar as obras do templo de S. Pedro em Roma, permitiu que um seu enviado, João Tetzel, percorresse a Alemanha vendendo bulas, assinadas pelo papa, as quais, dizia, possuíam a virtude de conceder perdão de todos os pecados, não só aos possuidores da bula, mas também aos amigos, mortos ou vivos, em cujo nome fossem as bulas compradas, sem necessidade de confissão, nem absolvição pelo sacerdote. Tetzel fazia esta afirmação ao povo: “Tão depressa o vosso dinheiro caia no cofre, a alma de vossos amigos subirá do purgatório ao céu”. Lutero, por sua vez, começou a pregar contra Tetzel e sua campanha de venda de indulgências, denunciando como falso esse ensino” (pág. 141).
- Pois bem, a citação acima retrata a “ponta de um grande iceberg” de heresias que caracterizavam o catolicismo romano. Como é sabido, desde o século IV quando a igreja católica romana surgiu como igreja institucionalizada e a igreja oficial do Império Romano, um grande processo de paganização invadiu a igreja de Cristo que até então se mantinha reta. Devido a uma grande quantidade de ensinos heréticos e práticas pagãs que se introduziram na igreja durante anos, vários cristãos sinceros procuraram promover, ao longo dos séculos, uma reforma na igreja cristã, como vimos na primeira parte do presente estudo; porém grande parte desses homens e mulheres de Deus foram mortos de maneiras terríveis por parte do alto clero romano que vivia mergulhado em iniqüidades.
- Digo isto, porque não podemos resumir como motivo principal da Reforma Protestante, a venda de indulgências realizada por Tetzel na Saxônia. Isto foi o mínimo! Foi apenas uma questão pontual, um escândalo. Na realidade, a igreja romana não possuía mais as marcas do cristianismo puro e verdadeiro. Sua essência era corrupta e encoberta por uma máscara de falsa santidade.
- Lutero não foi o primeiro a enfrentar essa situação, como já estudamos. Porém, é válido salientar que Lutero encontrou um cenário oportuno no qual uma série de fatores corroborou para o sucesso do movimento. O fator político, por exemplo, pode ser considerado como uma das causas indiretas que colaboraram com a eclosão da Reforma, uma vez que o ideal universal (hierarquia internacional da igreja romana) colidia com a consciência nacional das classes das novas nações-estados no noroeste da Europa. A idéia de igrejas nacionais trazida pela Reforma estava em harmonia com o pensamento de independência política e também religiosa dessas nações.
- O fator intelectual também contribuiu de forma marcante, tendo em vista que homens de mentes lúcidas e secularizadas adotaram uma postura crítica à vida religiosa proposta pela igreja católica romana nos seus dias. O humanismo da Renascença criou um espírito secular, crítico e investigativo que começou a enxergar novos horizontes de forma separada dos preceitos religiosos.
- O fator moral também foi de suma importância e decorre do fator intelectual, uma vez que os indivíduos passaram a ler o Novo Testamento de forma investigativa e na língua original (grego), percebendo claramente as discrepâncias existentes entre a Igreja sobre a qual liam no Novo Testamento e a igreja católica romana que viam no seu tempo.
- Por outro lado, acima de todos esses fatores e até mesmo de outros mais que possam existir, o fator principal para dar sentido à Reforma Protestante, foi o fator teológico e filosófico. A priori, urge mencionar que a igreja medieval adotou a filosofia de Tomás de Aquino que, por sua vez, ensinava que a vontade do homem não estava totalmente corrompida, isto é, o homem poderia alcançar a salvação através da fé acompanhada pela administração de sacramentos ministrados pela hierarquia clerical romana. Ao contrário dessa descabida heresia, Santo Agostinho, este sim coerente com a Bíblia, cria que a vontade do homem estava de tal modo depravada que ele nada poderia fazer por sua salvação. Deus outorgava ao homem a sua graça irresistível para dinamizar sua vontade a fim de que pudesse, pela fé, aceitar a salvação que Cristo lhe oferecia. A teologia de Santo Agostinho inspirou Lutero na doutrina de justificação pela fé baseada, sobretudo, no capítulo 1 da carta do Apóstolo Paulo aos Romanos.
- Em síntese, a causa teológica da Reforma Protestante foi o forte anceio dos reformadores de voltarem à fonte da fé cristã, isto é, voltar à essência da Palavra de Deus, a fim de refutar a teologia tomística que ensinava que a salvação era obtida através de sacramentos ministrados pela hierarquia da igreja romana, bem como refutar as heresias que formavam - e que ainda formam - o complexo doutrinário da igreja católica romana, totalmente afastado da Bíblia Sagrada.
- A venda de indulgências foi, portanto, apenas um escandaloso abuso que consistia em adquirir com dinheiro um documento que conferia o perdão de pecados. Diante desse abuso diabólico, no dia 31 de outubro de 1517, pela manhã, Martinho Lutero afixou na porta da Catedral de Wittenberg, um pergaminho que continha 95 teses, em sua maioria relacionadas com a venda de indulgências e a autoridade do papa. Os dirigentes da igreja católica tentaram em vão restringir Lutero, porém este se manteve firme e resoluto, mesmo diante dos ataques constantes que sofreu. Este famoso protesto de Lutero desencadeou vários acontecimentos que resultaram na Reforma na Alemanha, movimento este que se espalhou pelo norte e oeste da Europa.
- Destarte, a Reforma Protestante não foi um movimento isolado, mas está inserido em um contexto de grande importância para o desenvolvimento da humanidade, a saber, a Renascença ou o Renascimento somado a outros movimentos decorrentes desse período e que forçaram o nascimento da era moderna no século XVI, sepultando assim a Idade Média em todas as áreas, incluindo-se nestas, a religião.
- Nasceram, portanto, no campo da religião, as igrejas protestantes e todas elas tinham a Bíblia Sagrada como fonte de autoridade final. Lutero conservou em sua liturgia várias práticas não proibidas pela Bíblia. Na segunda fase da Reforma, o grande teólogo do período, João Calvino, inspirou as igrejas reformadas e presbiterianas na França, Holanda, Escócia, Suíça e Hungria a refutarem todas as práticas que não estavam de acordo com a Bíblia Sagrada. Mais radicais ainda, os anabatistas, que segundo alguns historiadores deram origem a uma parte dos Batistas, fizeram uma ruptura bem mais radical, pois procuraram criar uma igreja segundo os padrões do Novo Testamento. No final do século XVI na Inglaterra surge o movimento separatista (reforma radical) promovido pelos puritanos, originando as igrejas congregacionais independentes e separadas do Estado, e também os presbiterianos. Os congregacionais e presbiterianos, mais tarde, foram os pioneiros na evangelização da América do Norte (Pais Peregrinos), bem como na América do Sul (Brasil).
- Damos graças a Deus por Sua fidelidade com aqueles que defenderam e que ainda defendem a verdade, colocando a Palavra de Deus acima de tudo, pois as Sagradas Escrituras, para nós protestantes, são a nossa regra única de fé, prática e autoridade. De fato, as portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja edificada pelo Senhor Jesus Cristo.
Que Deus nos abençoe!

André G. Bronzeado.

Referências:

CAIRNS, Earle E. – O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. 2. Ed. – São Paulo: Vida Nova, 1995.
(1) HURLBUT, Jesse L."História da igreja cristã" - São Paulo: Ed. Vida, 2002.
Imagem: www.monergismo.com

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